João Miguel Tavares, no Sorumbático:
Há um ano estava no Centro Comercial Colombo e a minha filha mais velha desatou numa gritaria desalmada, já nem sei porquê, uma daquelas birras olímpicas que antes de termos os nossos filhos acreditamos ingenuamente que só acontecem aos filhos (mal-educados) dos outros. Tentei fazer como os árbitros de futebol: isolar o jogador para o punir disciplinarmente. Puxei-a para um canto, encostei-a à parede e tentei acalmá-la. Só que ela continuava a espernear e a gritar pela mãe, como se eu fosse o Jack Bauer em plena sessão de tortura, procurando saber a todo o custo onde estava a ogiva nuclear. Então, uma senhora dos seus 60 anos aproximou-se esbaforida, a berrar "você é mau pai, você é mau pai", dizendo-me para largar a criancinha e deixá-la ir ter com a mãe, senão chamava a polícia. A sério. (...)
Doses cavalares de mimo, desaparecimentos de Maddies e problemas de consciência de pais ausentes compõem uma fórmula de tal forma explosiva que as criancinhas se transformam em flores de jarra às quais parece mal tocar até com um dedo. O meu pai contou-me no outro dia que em miúdo levou um tabefe porque ao cumprimentar um adulto o tratou por "você" em vez de "senhor". Não é a este tempo que queremos voltar. Mas é preciso encontrar o equilíbrio entre distribuir sopapos por faltas de cortesia e não poder puxar uma criança para um canto sem se ser ameaçado com a polícia. Já é hora de acabar com o mito do bom rebelde. As crianças não são seres angélicos que o mundo corrompe. São bicharocos nem sempre encantadores, muitas vezes cruéis, que têm de ser educados para a vida e para se comportarem devidamente em sociedade.
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